segunda-feira, 30 de maio de 2011

A Vale mata

No dia 24/05 foram assassinados o casal de ambientalistas José Claudio e Maria do Espírito Santo em Nova Ipixuna, Pará. O assassinato foi realizado por pistoleiros contratados por mandantes: a prova sinistra que deixaram foi terem cortado a orelha de José Cláudio e a levado, claramente para mostrar ao mandante do crime de que o trabalho havia sido realizado com sucesso.

José Cláudio e Maria do Espírito Santo eram ambientalistas assentados no Projeto Agroextrativista Praialta-Piranheira. Integrantes do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), ONG fundada por Chico Mendes, os dois viviam e produziam de forma sustentável no lote de aproximadamente 20 hectares, onde 80% era de floresta preservada. Com a floresta se relacionavam e sobreviviam do extrativismo de óleos, castanhas e frutos de plantas nativas, como cupuaçu e açaí. No projeto de assentamento vivem aproximadamente 500 famílias. Eram líderes que travavam uma luta pela preservação da floresta e da vida na floresta.

Desde o ano 2000, o casal era vítima de ameaças de morte: quem os ameaçava, diziam eles, eram madeireiros e carvoeiros. Dentro de sua área de assentamento, havia algumas castanheiras, as poucas que restaram dessa região devido ao saque dos madeireiros. Não bastasse tanta castanheira que os madeireiros já saquearam da região, sua fome nunca termina, e eles estavam saqueando e matando as castanheiras do assentamento onde o casal morava, assim como as castanheiras da região. Pois bem: José Cláudio e Maria do Espírito Santo, ao denunciar e brigar com estes sujeitos para proteger as árvores, acabaram mortos por estes próprios sujeitos de motosserra na mão.

Quem é o verdadeiro responsável por este assassinato? Eu lhes digo: a Companhia Vale e o projeto de desenvolvimento do Governo Lula/Dilma. A Companhia Vale é uma grande corporação privada que recebe muito respaldo do Estado do nosso país para continuar com suas ações, que se resumem a extrair todo o ferro que conseguirem das serras repletas de minério que o nosso território possui. Eles explicam direitinho na página virtual deles.

Prá quê tanto ferro? É a própria Vale que nos explica, em sua página virtual, onde diz qual é a sua missão:

"Nossa missão:
Transformar recursos minerais em riqueza e desenvolvimento sustentável"


Assim, saqueando os recursos naturais de nosso e de outros territórios, a Vale se enriquece, e desenvolve nosso país. Qual é o tipo de desenvolvimento que uma produção acirrada de ferro proporciona para um país, e mais ainda, para toda a humanidade? Não sei qual é a concepção de desenvolvimento que esse pessoal tem na cabeça, mas de acordo com os sintomas deste desenvolvimento, já percebi que não é um desenvolvi-gente. Com o ferro produzem pátios com milhares de carros, e aviões, e navios, e sabe-se lá mais o quê (talvez usinas atômicas como aquela que explodiu no Japão).

Mas esse texto quer tratar de uma outra consequência, muito assustadora, dessa extração de ferro e seu manuseio: o ferro desmata a floresta, e mata gente. O carvão é usado preponderantemente na produção de ferro gusa e aço. Na produção de ferro gusa, o carvão cumpre duas funções: como combustível para gerar o calor necessário à operação do alto-forno da siderúrgica e como agente químico para retirar o oxigênio durante o processo. O ferro gusa da Amazônia é considerado o melhor do mundo porque usa o carvão vegetal e não o mineral.

E é assim que toda a cadeia funciona: o Estado quer um desenvolvimento, e os ricos querem mais riqueza (o que quer dizer, muitos dólares em seus bolsos). Em conluio, montam uma grande corporação chamada Companhia Vale, a qual, pelo menos nesta região de onde lhes escrevo do Pará, coloca cercas em torno de uma serra, a Serra dos Carajás, diz que aquilo tudo é dela, e começa a cavar um grande buraco, extrair o ferro e transportá-lo de navio e de trem para muitos lugares. Todo esse ferro vai para as siderúrgicas nacionais e multinacionais, que são incentivadas pela Companhia Vale através de joint ventures, e pelo Estado Brasileiro através daquela nossa conhecida abertura de pernas.

Chegando nas siderúrgicas, o forno para trabalhar esse ferro tem que ser alimentado com carvão, o qual é obtido através dos madeireiros, que com o apoio da falta de segurança do Estado (e da humanidade, visto que a Amazônia é um pulmão do mundo) frente a sua floresta, e ainda mais, com a concessão que este mesmo Estado oferece (principalmente com o Novo Código Florestal, que legitima o desmatamento de Áreas de Proteção onde o desmatamento já se iniciou), vem desmatando toda a floresta amazônica a olhos vistos. O mundo pensa que a coisa não é bem assim, mas é só dar um pulinho aqui no Pará e ver o que está acontecendo. Aqui em Marabá, por exemplo, tem um empreendimento que se chama Shopping da Madeira. Agora imaginem vocês aí o que é esse shopping da madeira. Isso é só um exemplo. A maior parte da madeira vai direto para os fornos das siderúrgicas.

E é assim que quando algum ser humano se levanta e diz: "Meu caro amigo, não mate essa árvore!", ou inicie uma vida na floresta, uma economia florestal (como iniciou e liderou o grande mestre Chico Mendes), esse ser humano leva tiro na cabeça.

Meus amigos: a Vale mata.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Etnografia

"Melhor seria cerrar as cortinas, deixar as distrações do lado de fora, acender o abajur, abreviar a pesquisa (...)" - Virginia Woolf, Um teto todo seu

Em uma etnografia, é preciso que se prove não roçar simplesmente superfícies, mas mostrar que havia mergulhado o olhar até as profundezas.

domingo, 27 de março de 2011

O Contrato

O proletariado achou a vingança de
Short, mini-blusa, barriguinha de fora
Ela pisca, pisca, a ordem de comando
"Lá revolucion não demora!"


Garota, cujo namorado era saopaulino, vira saopaulina em troca de seu namorado entrar para seu partidéco (a saber, o pistú).

terça-feira, 22 de março de 2011

Os hippies sob a ótica da territorialização/desterritorialização

O nômade move-se nos interstícios do corpo social, frequenta as fendas, as fraturas, os pontos de fuga e de ruptura; e ao mesmo tempo, antecipamos para desvanecer a imagem romântica, entra nas mais violentas suturas, reterritorializações, abolições, fascistizações. - parafraseando Néstor Perlongher (Territórios Marginais), que está parafraseando Duvignaud (Nomades et Vagabonds, Paris, 1975). O nômade é um transgressor em relação a ordem que transgride, mas é também um fascista, dentro do código interno que reterritorializa.

PAC, novas hidrelétricas e trabalhadores

21/03/2011 - 11:49 - Nota: Jirau de hoje pode ser Belo Monte, Tapajós e Teles Pires de amanhã

Esta semana, o canteiro de obras da hidrelétrica de Jirau, em Rondônia, virou um campo de batalhas; depois um inferno em chamas; depois um deserto de cinzas e aço retorcido.

Jirau concentra todos os problemas possíveis: em ritmo descontrolado, trouxe à região o "desenvolvimento" da prostituição, do uso de drogas entre jovens pescadores e ribeirinhos, da especulação imobiliária, da elevação dos preços dos alimentos, das doenças sem atendimento, e de violências de todos os tipos.

Em Julho de 2010, as populações atingidas pela obra já protestavam contra o não cumprimento de condicionantes, desrespeito e irregularidades no processo de desapropriação/expulsão de suas áreas, fraudes nas indenizações, etc. Em outubro, mais de um ano após o início das obras, os ministérios públicos Federal e Estadual de Rondônia impetraram uma ação civil pública contra o Estado, o município de Porto Velho, a União, o Ibama, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Energia Sustentável do Brasil (ESBR, empresa responsável pelas obras), por descumprimento de condicionantes nas áreas de saúde, educação, transporte e segurança. Até hoje, 70% não saíram do papel.

Sobre as condições dos trabalhadores no canteiro de obras, em 2009 trinta e oito pessoas foram libertadas de trabalho análogo à escravidão em uma prestadora de serviço da usina. Em 2010, uma nova fiscalização em Jirau produziu 330 autos de infração por crimes trabalhistas. Nos distúrbios ocorridos esta semana, pipocaram denúncias contra a construtora Camargo Correia: maus tratos, irregularidades no pagamento, não-pagamento de horas extra, ameaças, etc. Foi o combustível que fez a bomba explodir.

Depois, o que se viu foram milhares de trabalhadores vagando perdidos, esfomeados, desamparados e desesperados, sem dinheiro, roupas, sem ter pra onde ir ou onde dormir. Por que? Porque mais de 70% dos barrageiros de Jirau são de outros estados, de acordo com a Assembléia Legislativa de RO. Os empregos prometidos para a região viraram fumaça.

Este mesmo "desenvolvimento" imposto ao rio Madeira ameaça agora as bacias do Xingu, do Tapajós e do Teles Pires no Pará e no Mato Grosso. O projeto de Belo Monte, o mais avançado nestes rios, segue com assustadora semelhança os passos de Jirau: licença de instalação parcial ilegal, autorizações de desmatamento, descumprimento acintoso das condicionantes, ameaças a ribeirinhos e pequenos agricultores para que vendam suas terras, desrespeito absoluto aos direitos constitucionais das populações indígenas, e migração acelerada e desordenada de trabalhadores de fora.

Em fevereiro, representantes das bacias do Madeira, Xingu, Tapajós e Teles Pires, que compõem a Aliança dos Rios da Amazônia, se reuniram com o governo, que prometeu abrir o diálogo com os movimentos. Nenhuma sinalização de que este diálogo realmente ocorrerá foi dada até agora, mais de um mês depois.

Nos solidarizamos profundamente com todos que sofreram e ainda sofrerão com as violências de Jirau. Nos solidarizamos com os trabalhadores, com as populações atingidas, com as populações das comunidades e das cidades da região.

Mas Jirau é um sinal de alerta ao governo – principal responsável, em última instância, por tudo que acontece nas obras do PAC – e seus empresários: as violações sistemáticas de direitos das populações mais cedo ou mais tarde levam à reação. Não ha desmandos que ficam impunes, nem ameaças que permaneçam sem respostas.

Aliança dos Rios da Amazônia

Movimento Xingu Vivo para Sempre

Aliança Tapajós Vivo

Movimento Rio Madeiro Vivo

Movimento Teles Pires Vivo

Fonte: movimento Xingu Vivo.

Fonte: CIMI>

domingo, 20 de março de 2011

Domingo Sangrento

No Iêmen, a população sai em praça pública para protestar contra o governo, e o governo atira nos manifestantes, matando 52 deles. Na Líbia, o governador não quer vender seu petróleo aos europeus e americanos, e os europeus e americanos invadem o país com caças, matando metade da população em apenas uma noite. No Brasil, a polícia prende um cacique tupinambá, também atira nos manifestantes que foram xingar o Obama em sua visita para comprar todo nosso petróleo. Somos tratados feito gado de pasto, trabalhamos para os porcos da grana até o dia do nosso abate.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Folha Universal

Muito tenho me impressionado com o jornal Folha Universal, da Igreja Universal do Reino de Deus. Primeiro tinha me impressionado com a campanha que a Folha Universal estava fazendo pela Dilma Roussef. E agora, me impressiono com as reportagens de capa a favor do aborto. Há um discurso pela necessidade de planejamento familiar muito forte no argumento da Universal favorável ao aborto. E qual será a noção de mulher manejada aqui? Me impressiona, pelo fato de que sua adversária, a Igreja Católica, ser determinantemente contrária ao aborto, com um discurso de que o aborto é um assassinato.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Meu encontro com José Saramago

Primeira vez que li este velhinho bacana foi em 2010: o Ensaio sobre a Cegueira.



O cara é genial e tem me embasbacado a cada leitura. Tem umas idéias únicas: como a de reescrever o Velho Testamento sob o ponto de vista de Caim. Este livro, Caim, é por demais lúdico. A maneira como ele fala sobre o senhor que visitava algumas vezes Adão e Eva num jardim tedioso é impagável. Mostra o senhor como um personagem muito do malvado, cheio de frescuras e dado a picuinhas:

"Lúcifer sabia bem o que fazia quando serebelou contra deus, há quem diga que o fez por inveja e não é certo, o que ele conhecia era a maligna natureza do sujeito."

Faz-me pensar como é que em tempos como os nossos, podemos falar o que quisermos sobre a bíblia, que caiu na boca do povo e adeus, inquisidores. Narrativas fascinantes, senhor José!

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Dos poderes de um chapéu engraçado

A vida estava uma desgraça, e há pelo menos uns cinco dias que eu só pensava fortemente em como ganhar dinheiro rápido para pagar as contas pendentes - 35 reais do celular, 100 reais dos dreads no cabelo, 120 reais do kung fu - e para as contas vindouras da viagem para o Pará. Além do mais, desde domingo eu estou na Grande Fossa, por ter detonado com mais um namoro que para mim duraria pelo menos uns dez anos (e não passou dos um ano e meio). A Grande Fossa: sem vontade de levantar da cama, sem vontade de comer, ou de ao menos ver um filme engraçado. Menos ainda vontade de ler qualquer coisa, no que diz respeito a literaturas lúdicas ou místicos febris, ou qualquer outra coisa. Isso, aliado a gritante falta de grana, resultava em uma situação realmente deprimente.

Quando ontem a coisa pareceu mudar de figura: o Vagal apareceu em casa e comprou dois livros que ando vendendo. Fiquei bem feliz por ter nas mãos 20 reais para poder terminar a semana. Hoje o dia começa, e eu consigo fazer as coisas burocráticas da inscrição para o concurso do Pará. Eu estava tão animada com o fato de ter ganho vinte reais! E ainda tinha mais uns 8 reais no bolso, o que garantiria meu almoço e meu jantar do dia. Fui na Copy One escanear a ficha de inscrição e imprimir o currículo, e de repente fui tomada pelo desejo incontrolável de comprar um chapéu que eu havia visto na semana passada numa lojinha na Benjamin Constant. Pensei: não posso comprar nada, eu não tenho nem dinheiro para pagar minhas contas! Mas o desejo incontrolável me dizia: vai lá, você ganhou vinte reais, vai lá!

Passei em frente a loja, que era caminho para os correios, e simplesmente entrei e comprei o chapéu. Desde ali, eu não sabia como aquele chapéu ia transformar a minha sorte. Fui ao correio e gastei 50 reais para mandar a porra da carta para o Pará: desgraça! Ainda me sobravam os 8 reais para o almoço e o jantar, e eu tinha vontade de cozinhar, então parti para o Mercadão. Do nada, me aparece um hippie, que começou com uma conversinha mole e pirou que eu estava sofrendo e passando fome e que iria me ajudar. Começou a me pagar tudo: o peixe, os pêssegos, a verdura. Pensei poxa até que enfim todas as moedas que dou para os pedintes da rua estão voltando, alguém resolveu olhar para mim e me fazer caridade. Pegou meu telefone e disse que ia me arrumar umas pulseiras fulerágem pra eu vender na viagem para o Pará.

Cheguei em casa e estava muito perturbada com aquele acontecimento. A perturbação demorou alguns bons minutos para passar. E eis que a minha sorte começou a mudar. Como hoje foi um dia produtivo! Cozinhei, li James Joyce, escrevi etnografia de pastor e de crente, comi pêssegos, até consegui ver um filme inteiro, o Machete, descobri o incrível efeito do chá verde com jasmim e mel, fiz carteiras de caixa de leite, desmontei um guarda-chuva e montei outro - o que aliás é uma experiência incrível esta de desmontar guarda-chuvas -, são 21h30 e ainda quero começar a ver um dos dois filmes que finalmente chegaram: mais um Agnes Varda e um filme de Bollywood. Acho que vai ser o Bollywood. E para melhorar mais ainda, o dinheiro que gastei no chapéu já voltou: consegui a minha primeira venda pela Internet, a Jocimara comprou uma de minhas bonitas carteiras feitas a mão por 20 reais. (!!!)

Incrível o que um chapéu engraçado não faz com sua vida. Os chapéis engraçados realmente possuem poderes ainda desconhecidos pela raça humana.

Ps: Não posso deixar de notar que ler o blog do Bill o dia inteiro foi uma atividade, senão a principal, importantíssima para me tirar da Grande Fossa, assim como para me levar a ver um filme inteiro e a escrever esse texto no blog. Obrigada, Bill!!

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Sobre quilombolas não serem ex-escravos

Preciso registrar aqui uma conversa que tive com o Andread enquanto ele fazia meus dreads. Era sobre um mito de origem que eu reconheci ao transcrever as entrevistas do Isaías, que estava pesquisando o quilombo do Baixius (MT).





O Andread relembrou da coisa do John Montero, teoria dos negros da terra. De que já existia gente aqui antes da "descoberta" dos europeus. Gente que não era só índio, mas gente de todo o tipo.

Questão de Fé e Questão de Realidade

Lendo o blog do Bill (billmementomori.blogspot.com), me deparei com um parágrafo muito bom. Resolvi copiá-lo aqui, para usar depois. Quem sabe em futuras aulas de Antropologia sobre Carlos Castaneda e seus xamãs acrobáticos.


"Penso agora em alguém que vai pruma sessão espírita, e o médium recebe um espírito. Praquelas pessoas, aquilo é real. Não é uma questão de fé. Há realmente um espírito ali. E foda-se o que eu acho. Aquilo é real. Independente do que a ciência ou o ateu que mora dentro de mim diz."

Muito bem, Bill.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Esther Vivas/Via Campesina - Comer é um ato político

Esther Vivas é membro do Centro de Estudos sobre Movimentos Sociais de la Universitat Pompeu Fabra en Barcelona, ativista e co-autora de livros como Del campo al plato (Icaria editorial, 2009) o Supermercados, no gracias (Icaria editorial, 2007), entre outros.

Você é co-autora do livro “Del Campo al Plato” (Ed. Icaria, 2009). ¿Opinas que estão nos envenenando?

O modelo de produção de alimentos antepõe interesses privados e empresariais às necessidades alimentares das pessoas, a sua saúde e a respeito ao meio ambiente. Comemos o que as grandes empresas do setor querem. Hoje há o mesmo número de pessoas no mundo que passam fome que pessoas com problemas de sobrepeso, afetando, em ambos casos, aos setores mais pobres da população tanto nos países do norte como do sul. Os problemas agrícolas e alimentares são globais e são o resultado de converter os alimentos em uma mercadoria.

925 milhões de pessoas no mundo ainda passam fome. Esta é uma prova do fracasso do capitalismo agro-industrial?

Sim. A agricultura industrial, quilométrica, intensiva e petrodependente demonstrou ser incapaz de alimentar a população, uma vez que tem um forte impacto no meio ambiente reduzindo a agro-diversidade, gerando mudança climática e destruindo terras férteis. Para acabar com a fome no mundo não se trata de produzir mais, como afirmam os governos e as instituições internacionais. Pelo contrário, faz falta democratizar os processos produtivos e propiciar que os alimentos estejam disponíveis para o conjunto da população.

As empresas multinacionais, a ONU e o FMI propõe uma nova “revolução verde”, alimentos transgênicos e livre comécio. Que alternativa pode ser proposta desde os movimentos sociais?

Faz falta recuperar o controle social da agricultura e da alimentação. Não é possível que umas poucas multinacionais, que monopolizam cada uma das etapas da cadeia agro-alimentar, acabem decidindo o que comemos. A terra, a água e as sementes devem estar nas mãos dos campesinos, daqueles que trabalham na terra. Estes bens naturais não devem servir para fazer negócio, para especulação. Os consumidores devem ter o poder de decidir o que comer, se queremos consumir produtos livres de transgênicos. Em definitivo, temos que apostar na soberanía alimentar.

Poderia definir o conceito de “soberanía alimentari”?

Consiste em tener a capacidade de decidir sobre tudo aquilo que esteja relacionado com a produção, distribuição e consumo de alimentos. Apostar no cultivo de variedades autóctonas, de temporada, saldáveis. Promover os circuítos curtos de comercialização, os mercados locais. Combater a competencia desleal, os mecanismos de dumping, os incentivos a exportação. Conseguir este objetivo implica uma estratégia de ruptura com as políticas da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Mas reivindicar a soberanía alimentar não implica um retorno romântico ao passado, pelo contrário, se trata de recuperar o conhecimento das práticas tradicionais e combiná-las com as novas tecnologías e saberes. Asim mesmo, não consiste em uma proposição localista e sim de promover a produção e o comércio local, na qual o comércio internacional funcione como um complemento do anterior.

A Vía Campesina afirma que hoje comer se converteu em um “ato político”. Está de acordo?

Completamente. O que comemos é resultado da mercantilizaç]ao do sistema alimentar e dos intereses do agro negócio. A mercantilização que se está levando a cabo na produção agro-alimentar é a mesma que afeta a outros muitos âmbitos de nossa vida: privatização dos serviços públicos, precarização dos direitos trabalhistas, especulação com a habitação e o território. É necessário antepor outra lógica e organizar-se contra o modelo agro-alimentar atual nos marcos de um combate mais geral contra o capitalismo global.

Estamos nas mãos das grandes cadeias de distribução? O que implica isso e que efeitos tem este modelo de consumo?

Hoje, sete empresas no Estado Español controlam 75% da distribuição dos alimentos. E esta tendencia representa mais. De tal maneira que o consumidor cada vez tem menos portas de acesso a comida e o mesmo acontece com o produtor na hora de chegar ao consumidor. Este monopolio garante um controle total aos supermercados na hora de decidir sobre nossa alimentação, o preço que pagamos pelo que comemos e como foi elaborado.

Servem as soluções individualistas para romper com estas pautas de consumo?

A ação individual tem um valor demostrativo e aporta coerência, mas não gera mudanças estruturais. Faz falta uma ação política coletiva, organizar-nos no âmbito do consumo, por exemplo, a partir de grupos e cooperativas de consumo agroecológico; crias alternativas e promover alianças amplas a partir da participação em camapanhas contra a crise, em defesa de territorio, fóruns sociais, etc…

Também és necessário sair as ruas e atuar políticamente, como em determinado momento se fez com a campanha da Iniciativa Legislativa Popular contra os transgênicos impulsionada por “Som lo que Sembrem”, porque, como já sew viu em muitas ocasiões, aqueles que estão nas instituições não representam nossos interesses mas sim os privados.

Kyoto, Copenhague, Cancún. Qual o baçanço geral que se pode fazer das diferentes cúpulas sobre mudança climática?

O balanço é muito negativo. Em todas estas cúpulas pesaram muito mais os interesses privados e o curto prazo e não a vontade política real para acabar com a mudança climática. Não foram feitos acordos vinculantes que permitam uma redução efetiva dos gases de efeito estufa. Ao contrário, os critérios mercantis têm sido uma vez mais a moeda de troca, e o mecanismo de comércio de emissões são, neste sentido, a máximo expressão disso.

Em Cancún foi muito utilizada a ideia de “adaptação” a mudança climática. Se escondem detrás os interesses das companhias multinacionais e de um suposto “capitalismo verde”?

Isso mesmo. Em lugar de dar soluções reais, se opta por falsas soluções como a energía nuclear, a captação de carvão da atmosfera para seu armazenamento ou os agro-combustíveis. Se trata de medidas no qual o único que fazem é agudizar ainda mais a atual crise social e ecológica e, isto sim, proporcionar uma grande quantidade de beneficios para umas poucas empresas.

O Movimento pela Justiça Climática trata de oferecer alternativas. Como nasce e quais são seus princípios?

O Movimiento Pela Justiça Climática faz uma crítica às causas de fundo da mudança climática, questionando o sistema capitalista e, como muito bem diz seu lema, se trata de “mudar o sistema, não o clima”. Deste modo expressa esta relação difusa que existe entre justiça social e climática, entre crise social ecológica.

O movimento vem tendo um forte impacto internacional, sobretudo esteve na raíz dos protestos na cúpula do clima de Copenhague e, mais recentemente, nas mobilizações de Cancún. Isto contribuiu para visualizar a urgencia de atuar contra a mudança climática. O desafio é ampliar sua base social, vinculando as lutas cotidianas e buscar alianças com o sindicalismo alternativo.

A solução é mudar o clima ou mudar o sistema capitalista?

Faz falta uma mudança radical de modelo. O capitalismo não pode solucionar uma crise ecológica que o sistema mesmo criou. A crise atual coloca a necessidade urgente de mudar o mundo de base e fazê-lo desde uma perspectiva anticapitalista e ecologista radical. Anticapitalismo e justiça climática são dois combates que devem estar estreitamente unidos.

*Entrevista realizada por Enric Llopis para Rebelión.

Tradução de Paulo Marques para o site Brasil Autogestionário www.brasilautogestionario.org

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

coitadinha da minha samambaia... aprendeu a comer lagartas tarde demais.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Campo sem querer

Manhã de 12 de janeiro de 2011.

Fui tomar um café na rua 11 de agosto e estava sentado na calçada um desses bêbados sujos e profetas, comendo um quibe com limão. Pedi um café pra moça, e um cara que estava na porta comendo um pão de queijo, lança:

Cara - … onde é a Toca de Assis.
Moça – ah eu sei que é ali pra baixo. É uma tristeza ver essa gente assim, eu tenho dó dos velhos, que foram abandonados pelas famílias, é triste e a gente ajuda, meu pai ajuda, dá comida, mas a maioria é esses homens novos, que você vê que tem capacidade pra trabalhar, tem tanto emprego no brasil hoje, a gente vê sempre chamada pedindo ajudante de pedreiro, faxineira, pode não ser um bom emprego, mas já é um começo né/
Profeta – e vocês acham que eles me dão alguma chance? Meu pai tentou me matar. Eu sou amigo de todo mundo, da polícia, eu sou amigo, do PCC também. Todos eles tentaram me cooptar, mas eu continuei firme.

Eu – foi você que perguntou da Toca ou ele?
Cara – Foi ele. Ah eu conheci a Toca no Rio de Janeiro.
Moça – ah você conhece? É ali pra baixo não é?
Eu – é, eu moro aqui perto e tinha uma Toca ali, mas não tem mais, fechou em 2008, eu acho.
Cara – ah, esses caras é assim, eles dão uma comida, faz a barba, e manda pra rua de novo.
Moça – o padre roberto ainda tá lá com eles?
Cara – num sei, num conheço.
Moça – ah o padre roberto é muito bom, nossa, eles são muito bons, eles moram com esses morador de rua na mesma casa, e eles não ficam assim impondo, sabe, tem uns que até bebem lá dentro, porque gente assim tem vez que não dá nem pra tirar a bebida mais, a pessoa passa mal se não bebe, e lá na Toca eles permite.
Cara – é a abstinência. Tem viciado em heroína que se você tira a heroína dele, ele morre. Então tem que substituir por outra droga.
Moça – É. Mas esse padre roberto é muito bom, uma vez eu ia nas missas dele, e ele faz as missas com os morador de rua tudo lá com ele na igreja, e tem hora que esses pessoal fica tudo louco e ele deixa eles dentro da igreja mesmo assim. Teve uma vez que um deles começou a gritar no meio da missa “Aee Robertão!! Aee Robertão!! Eu gosto desse cara!!” e ele ficou falando, assim, “calma, fica quietinho agora que é a hora da missa”.
Cara – é, tem a piada de um cara desses que aparece numa missa e começa a gritar “Eu sou jesus!! eu sou jesus!!”...
Eu – é, acho que não tem mais toca por aqui não..
Cara – ah tem uma ali perto daquela igreja..
Eu – perto da Universal?
Cara – é, eu pelo menos sempre vejo um monte deles ali.
Profeta – é no parque industrial que eles tão.
Moça – mas a Toca sabe, eles apesar de ter um trabalho tão lindo, eles recebem muita doação de alimento, mas dinheiro mesmo, pra pagar o aluguel, eles nunca recebem. O padre falava que tinham que pagar o alguel de 3 mil reais por causa da casa ser grande, para poder acolher esse povo né, mas ninguém dava.
Profeta – esse negócio de falar que não tem dinheiro é tudo mentira. Até eu que tô na rua tenho dinheiro.
(saca um real do bolso e pede uma pinga. A moça pergunta pra gente se vende ou não, porque tem medo que daí ele fique ali o dia inteiro. O profeta diz que vai beber e vai embora. Ele pega aquele copo cheio de pinga e bebe numa golada só, como se fosse água!!)
Cara – é, mas esse povo não é da Igreja? Dizem que tem aquela Canção Nova lá..
Eu – é, essa Canção Nova tem muita grana.
Cara – e vê se eles ajudam gente assim? Não. Outro dia eles tavam pedindo doação de ouro pra construir um templo.
Eu- pois é, eu vi isso, maior sujeira, por que eles pedem doação de ouro pra construir um templo? Que palhaçada.
Cara – é, inda se fosse pra usar o ouro pra alguma coisa, né.
Profeta – nunchaco, espada, eu sei tudo sobre isso. Eu sou muito bom de xadrez.
Eu – Mas você conhece a Toca de onde, você já veio pra Campinas?
Profeta – eu sou de Campinas.
Eu – ah então você sabe onde é.
Profeta – eu sei mas eu num tô achando.
Eu – é, que eles tão meio sumido, fechou um monte de casa, muita gente saiu fora. Outro dia eu encontrei uma mulher passando mal na rua, liguei lá na Toca e eles num quiseram saber, disseram que não tinham recurso.
Profeta – Recurso! Sei. Esses evangélicos, eles tem que ajudar sempre. Eles não podem negar ajuda. Mas tem vez que muita gente num ajuda. Melhor são os espíritas, esses sim são caridosos.
Eu – ah é? Não sabia não. Eles também acreditam em Jesus né.
Profeta – eu acredito em Jesus. In Jesus.. the true god. O Vaticano é um estado livre.
Eu – é, mas tem muita sujeira lá dentro, não tem?
Profeta – você sabe de onde vem esse papa, o Hatzinger?
Eu – da alemanha?
Profeta – da Opus Dei! Isso é o final dos tempos. O mundo está no final dos tempos. Os maias disseram que seria em 2012. Está chegando. Vai acabar tudo. Estamos no final. Eu posso estar aqui na rua, sujo, fétido, mas eu sei muito bem das coisas. Eu estou aqui, sujo, fétido. Mas eu sei de tudo. Eu sei de tudo.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Regras

O livro mais assustador que eu já li na vida: as Regras de São Bento.

Meu Deus!! Franc Rodé foi substituído por um brasileiro!!

Vaticano: Arcebispo brasileiro vai presidir à Congregação para os religiosos

Bento XVI substitui cardeal Franc Rodè por D. João Braz de Aviz

Cidade do Vaticano, 04 Jan (Ecclesia) – Bento XVI nomeou hoje o arcebispo brasileiro João Braz de Aviz, de 63 anos, como novo prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica (CIVCSVA), no Vaticano.

O até agora arcebispo de Brasília substitui no cargo o cardeal esloveno Franc Rode, de 76 anos de idade, que atingira a idade máxima estipulada pelo direito canónico para exercer funções na Cúria Romana (75 anos), o conjunto dos organismos que coadjuvam o Papa no exercício da sua missão.

D. João Braz de Aviz nasceu em Mafra, Diocese de Joinville, a 24 de Abril de 1947. Depois de estudar Filosofia no Seminário Maior "Rainha dos Apóstolos" de Curitiba e na Faculdade de Palmas, completou os estudos teológicos, em Roma, nas universidades pontifícias Gregoriana e Lateranense.


Ordenado sacerdote a 26 de Novembro de 1972, foi pároco em várias paróquias, reitor dos Seminários Maiores de Apucarana e Londrina, bem como professor de Teologia Dogmática no Instituto Teológico Paulo VI, em Londrina.

Foi nomeado arcebispo de Maringá a 17 de Julho de 2002 e arcebispo de Brasília a 28 de Janeiro de 2004.

Desde a sua eleição, em Abril de 2005, Bento XVI nomeou um novo Secretário de Estado, substituiu nove prefeitos nas nove Congregações da Cúria Romana (duas vezes na Congregação para o Clero) e dez dos onze presidentes dos Conselhos Pontifícios, tendo ainda criado um novo Conselho, para a Nova Evangelização.

Segundo a Constituição "Pastor Bonus", de João Paulo II (28 de Junho de 1988), que reformulou a Cúria Romana, a CIVCSVA ocupa-se de tudo o que diz respeito aos Institutos de Vida consagrada (Ordens e Congregações religiosas, seja masculinas quer femininas, Institutos seculares) e as Sociedades de Vida apostólica, quanto a regime, disciplina, estudos, bens, direitos e privilégios.

Elenco

(Indica-se o ano de nomeação para o cargo. Em itálico, os nomeados por João Paulo II)

Secretaria de Estado do Vaticano (Secretário) – Cardeal Tarcisio Bertone (Itália) - 2006

Congregações

Doutrina da Fé – Cardeal William J. Levada (EUA) – 2005

Igrejas Orientais – Cardeal Leonardo Sandri (Argentina) – 2007

Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos – Cardeal Antonio Cañizares Llovera (Espanha) – 2008

Causas dos Santos – Cardeal Angelo Amato (Itália) – 2008

Evangelização dos Povos – Cardeal Ivan Dias (Índia) – 2006

Clero – Cardeal Mauro Piacenza (Itália) – 2010

Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica – Arcebispo João Braz de Aviz (Brasil) - 2011

Educação Católica (Seminários e Institutos de Estudo) – Cardeal Zenon Grocholewski (Polónia) - 1999

Bispos – Cardeal Marc Ouellet (Canadá) – 2010



Conselhos Pontifícios

Leigos – Cardeal Stanislaw Rylko (Polónia) - 2003

Promoção da Unidade dos Cristãos – Cardeal Kurt Koch (Suíça) - 2010

Família – Cardeal Ennio Antonelli (Itália) - 2008

"Justiça e Paz" – Cardeal Peter Turkson (Gana) - 2009

"Cor Unum" – Cardeal Robert Sarah (Guiné-Conakry) - 2010

Pastoral dos Migrantes e Itinerantes – Arcebispo Antonio Maria Vegliò (Itália) - 2009

Pastoral da Saúde – Arcebispo Zygmunt Zimowski (Polónia) - 2009

Textos Legislativos – Arcebispo Francesco Coccopalmerio (Itália) - 2007

Diálogo Inter-religioso – Cardeal Jean-Louis Tauran (França) - 2007

Cultura – Cardeal Gianfranco Ravasi (Itália) - 2007

Comunicações Sociais – Arcebispo Cláudio Maria Celli (Itália) - 2007

Nova Evangelização – Arcebispo Rino Fisichella (Itália) – 2010

OC

Lixo Stalker

No bairro onde mora minha mãe, as pessoas jogam coisas muito interessantes no lixo. Hoje, conheci um cara que sai com seu carro dando rolê pelo bairro toda manhã em que é dia de coleta de lixo reciclável. Ele coletou dois quadros enormes, pintados por crianças, no lixo essa manhã. Pena que ele chegou antes de mim... as telas eram boas mesmo.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

breve anotação de campo

Ressurgimento do padre em dezembro de 2010, sob uma nova roupagem.

Atualizações recentes no que diz respeito a vida contemplativa em janeiro de 2011: há um sublinhar da vida contemplativa, que é fortalecida e evidenciada. Restaura-se a história da comunidade a partir do carisma da vida contemplativa (enfocando-se na primeira casa, a Bendita Árvore da Cruz, e com isaso, no padre fundador, que é resgatado, no passado, para fortalecer um presente que se constitui em sua ausência) e fortalecem-se casas voltadas apenas para a vida contemplativa - são quatro casas hoje, da vida contemplativa feminina. Inclusive a casa de Vinhedo se reinstaurou. Continua a casa de Londrina, grande modelo, e mais uma no Ceará e outra que não me lembro agora onde é.

No fortalecimento da vida contemplativa nas casas, a questão do viver sob a divina providência também é fortalecida: me parece que aqui na contemplação, eles encontraram a válvula de possibilidade da continuidade do viver de doação, prática que antes se queria desinstituir devido as regras do direito canônico a proibir.