sábado, 11 de fevereiro de 2017

Escrever para não esquecer

E foi em um dia de Nossa Senhora de Lourdes que eu obtive um grande discernimento, uma graça das mãos desta Mãe Divinal.

Há dias eu estava tendo manhãs terríveis. Acordava me sentindo doente e extremamente cansada, como se tivesse estado em uma batalha, ao invés de estar dormindo e descansando. Percebi grandes manchas verdes nas minhas pernas. Na manhã do dia de Nossa Senhora de Lourdes, meu sofrimento era tamanho que tinha ânsias de vômito. Eu tinha pesadelos terríveis. Naquela noite, havia estado em umbrais extremamente sombrios, repletos de almas sofredoras. Muita gente, muita gente mesmo. E eu não vencia as batalhas, muito pelo contrário, eu me aliciava a eles e me comportava como eles.

No sonho, me apareceu um resgate. Um grupo de cinco espíritos de luz me tiraram dali e me levaram para a Nova Jerusalém. Como é tão bela esta capital! Uma catedral de ouro, detalhes dourados perpassam toda a cidade, com relevos em forma de pomba e cruzes e toda a simbologia cristã. Após esse rolê pelo Paraíso, me levaram de volta para onde sofriam as gentes. "É preciso que você esteja aqui. Eles precisam de luz. Não os julgue, todos são filhos de Deus, todos merecem a salvação. Todos merecem o perdão."

Todos são filhos de Deus. "Não os julgue, todos merecem a salvação. Todos merecem o perdão." Foi uma chave de ouro estas palavras. Se eu me sentia doente pelas manhãs, significava que eu era uma médium que estava sendo obsidiada. Médiuns obsidiados, isso não é nada bom. Eles estavam ali, ou melhor, eu estava ali com eles porque eu precisava rezar por eles.

Então fiz meu pedido: Oh minha Nossa Senhora de Lourdes, só uma coisa eu Vos peço: vá ao encalço dessas almas, vá iluminar estas almas sofredoras! Sou fraca para uma missão tão grande, a luz que eles precisam vêm somente de Vós!" Percebi que a luz não poderia vir de mim, eu era apenas uma mensageira, aquela que consegue chamar e ser atendida. Como Santa Faustina.

E com a graça de Deus e da Virgem Maria, eu fui atendida. Ao retornar para lá, aqueles seres estavam tão mudados. Estavam sadios, sentados em volta de um estudo sobre as Medicinas. Rapé, San Pedro. Obtendo suas curas e aprendizados.

Em uma outra roda, muitos me confessavam que ainda faziam uso, depois de usarem todas as medicinas, ainda faziam uso do álcool e do crack. Mas graças a Deus, minhas forças haviam se reestabelecido, e Nossa Senhora estava comigo em meu encalço. Um dos rapazes, sentindo as presenças que me guiavam, prontamente começou a fazer uma grande limpeza. Eram as curas chegando, as curas que estávamos chamando.

Acordei com o coração tão aliviado, como se o Sol estivesse morando dentro de mim. Obrigada, Senhor Deus, pelas curas e pelas graças recebidas! Ensina-me a dar a Ti tudo o que é Teu, pois amar-te nos pequeninos é muito mais. E Vos amar é tudo o que eu quero para cada segundo da minha existência!

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Para não esquecer como se escreve um artigo

Acordar estava sendo cada dia mais difícil, posto que os dias iam se passando, e meu texto não conseguia sair dos dois primeiros parágrafos que descreviam o trajeto de Roque de Barros Laraia pela floresta densa em 1961. Eu abria meus olhos e a vontade de desistir me dominava, fazendo aliança a sonhos ruins. Naquele dia, me levantei com dificuldade, e a única motivação para eu sair de casa foi mentalizar um café expresso que tinha descoberto ali perto de casa e perto do trabalho.

A todo o momento eu tentava me lembrar como é que, no passado, eu havia conseguido escrever relatórios para agências de fomentos, e até artigos científicos que haviam sido aceitos para publicações em revistas acadêmicas de Antropologia. Como é que eu fazia? Como é que eu sabia escrever?

Em casa, não conseguia estudar, e no ambiente doméstico meu psicológico se encontrava cada vez mais abalado. Após a restauração momentânea obtida através da xícara de café expresso, obriguei meu corpo e minha alma a ir até a escola. A ideia era fincar a bunda em uma mesa da sala dos professores, e não sair de lá até que os deuses da escrita viessem em meu auxílio. Subindo a ladeira que dá acesso à escola, falei com Jesus Cristo na minha máxima sinceridade possível: "Meu amigo, me dê um sinal. Se eu não sair desses dois primeiros parágrafos no dia de hoje, prometo que amanhã mesmo faço as minhas malas, boto dentro do carro e pego o beco nessa Belém-Brasília."

E ali fiquei, sentada na mesa, olhando para a cara do computador, arriscando alguns rabiscos, apagando tantos outros, das doze horas até às dezoito horas da tarde. Lá por perto das dezessete e trinta, os deuses da escrita finalmente começaram a baixar, e foi então que me lembrei como é que eu tinha feito para escrever aquele artigo que consegui publicar há uns cinco anos atrás. E para não esquecer, deixo aqui o registro.

Eu me obrigava a sair cedo e ia para a biblioteca. Saía cedo, entrava na biblioteca, abria meu computador, e alternava um chocolate e um café, até a hora do almoço. Almoçava rapidamente e voltava para a biblioteca, só saía de lá na hora de fechar. Depois de uns três dias seguido fazendo isso, os deuses da escrita começaram a vir me visitar, e o texto começou a fluir. Em duas semanas, eu tinha meu artigo pronto. Bingo! Me lembrei! Esse é o macete: acostumar o corpo e a alma a estarem em um só lugar por uns tantos dias, exercendo este mesmo exercício de escrita.

domingo, 5 de fevereiro de 2017

Sobre escrever

Estou com dificuldade em escrever minha dissertação, e então me lembrei das dicas de Malinowski. Se não me engano, ele dizia que era bom ler uma literatura enquanto escreve as letras acadêmicas (meus professores também diziam isso na faculdade), e além disso, manter um diário pessoal.

Esse diário pessoal, me parece, é para desentupir essas veias de palavras que não querem sair. Então se escreve livremente sobre quaisquer bobagens, para as palavras bobas irem saindo de mim, e dando espaço para saírem algumas palavras boas que possam descrever academicamente as paisagens que me dispus a descrever. Também, ao que me parece, este diário pessoal de bobagens é para ir treinando a fluidez da escrita. Escrever assim, livremente sobre qualquer bobagem, para ir treinando essa fluidez, e quando menos se espera, lá está você, fluindo como um barquinho, no seu texto acadêmico.

Não acho meu nome bonito, é tão estranho e não parece significar nada. Então fui pesquisar, e descobri que é o nome de uma cor, a cor amarela, em latim. Uma origem latina, a língua dos padres, a língua que eu queria aprender na época da faculdade quando eu ainda era assim tão poética e disposta a dedicar meu tempo a atividades que não levam ninguém a lugar nenhum. Amarelo ouro, ou dourado. Cor do Sol, então me alegro por meu nome remeter ao Sol Dourado.

Está entupida essa minha fonte das boas palavras. Então vou começar a escrever palavras sem sentido ou relação entre si, só para elas irem saindo de mim e desentupindo a fonte. Vermelho, soldado, sangue. A mágica magia, ou será que meus dons de escrita mediúnica me abandonaram finalmente? Sempre foi fácil para mim escrever, mas depois considerei esta uma sina, como uma cruz pesada a se carregar. Ah a sina da escrita.... é um caminho sem volta, dispõe-se a escrever e depois lá está, enredada em compromissos, querendo estar em outro lugar mas não, é preciso cumprir com o que se prometeu. A sina da escrita que é amiga da sina de nunca conseguir desistir ou perder. Não posso perder, não posso desistir, imagina, isso não combina comigo, a vencedora das vencedoras.

Eu vou pelo Sol, caminhando neste espaço. Eu vôo pelo Sol, com a Lua me acompanhando. E a coragem de apagar tudo, e a autocrítica bem ferrenha, de se ler, reconsiderar, apagar tudo e reinventar outras frases. Considero uma sina também essa da antropologia, aonde já se viu, ter a intenção de descrever povos, lugares que se viu numa experiência real... quando as letras só se prestam a descrever magias, fantasias de mundos invisíveis, de histórias inventadas! E colocar o pé no chão de uma realidade, e intentar uma experiência assim tão sóbria! Meio agarrada na ilusão, que é principalmente numa ilusão estatal das histórias dos povos que habitam esta terra. Que saudade do jornalzinho da escola. Da redação com temática livre. Mas foi você mesma quem inventou, foi tu mesma que se dispôs! Passou madrugadas em claro empolgada com um novo projeto, descrever mais um povo de história assim tão fascinante, ao invés de ir dormir ou conversar com os espíritos que andam pelo mundo para curar os enfermos, numa prosa assim inocente, sem intenções.

E lá vou eu para mais um eterno retorno, o de estar tão agarrada a compromissos líteros, quando o compromisso maior é o do amor para com os meus! Foi assim na reta final do primeiro mestrado. E está sendo assim na reta final deste agora.

Este diário pessoal, pelo que eu me lembre das dicas do Maliniwski, é para ir escrevendo, escrevendo, desentupindo a fonte das letras e nunca mais se relendo. É só para ir fazendo esse rio, ou esse mar, um montoado de letras desconexas, que não se pode ler ou reler pois se é rio, já foi, está longe indo para o mar. Ufa! Já não era sem tempo, uma técnica de escrita em que não se tem o compromisso de saber se está bom ou ruim. Apenas soltar essas amarras, essas líteras amarradas em algum corredor apertado.