quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Dos poderes de um chapéu engraçado

A vida estava uma desgraça, e há pelo menos uns cinco dias que eu só pensava fortemente em como ganhar dinheiro rápido para pagar as contas pendentes - 35 reais do celular, 100 reais dos dreads no cabelo, 120 reais do kung fu - e para as contas vindouras da viagem para o Pará. Além do mais, desde domingo eu estou na Grande Fossa, por ter detonado com mais um namoro que para mim duraria pelo menos uns dez anos (e não passou dos um ano e meio). A Grande Fossa: sem vontade de levantar da cama, sem vontade de comer, ou de ao menos ver um filme engraçado. Menos ainda vontade de ler qualquer coisa, no que diz respeito a literaturas lúdicas ou místicos febris, ou qualquer outra coisa. Isso, aliado a gritante falta de grana, resultava em uma situação realmente deprimente.

Quando ontem a coisa pareceu mudar de figura: o Vagal apareceu em casa e comprou dois livros que ando vendendo. Fiquei bem feliz por ter nas mãos 20 reais para poder terminar a semana. Hoje o dia começa, e eu consigo fazer as coisas burocráticas da inscrição para o concurso do Pará. Eu estava tão animada com o fato de ter ganho vinte reais! E ainda tinha mais uns 8 reais no bolso, o que garantiria meu almoço e meu jantar do dia. Fui na Copy One escanear a ficha de inscrição e imprimir o currículo, e de repente fui tomada pelo desejo incontrolável de comprar um chapéu que eu havia visto na semana passada numa lojinha na Benjamin Constant. Pensei: não posso comprar nada, eu não tenho nem dinheiro para pagar minhas contas! Mas o desejo incontrolável me dizia: vai lá, você ganhou vinte reais, vai lá!

Passei em frente a loja, que era caminho para os correios, e simplesmente entrei e comprei o chapéu. Desde ali, eu não sabia como aquele chapéu ia transformar a minha sorte. Fui ao correio e gastei 50 reais para mandar a porra da carta para o Pará: desgraça! Ainda me sobravam os 8 reais para o almoço e o jantar, e eu tinha vontade de cozinhar, então parti para o Mercadão. Do nada, me aparece um hippie, que começou com uma conversinha mole e pirou que eu estava sofrendo e passando fome e que iria me ajudar. Começou a me pagar tudo: o peixe, os pêssegos, a verdura. Pensei poxa até que enfim todas as moedas que dou para os pedintes da rua estão voltando, alguém resolveu olhar para mim e me fazer caridade. Pegou meu telefone e disse que ia me arrumar umas pulseiras fulerágem pra eu vender na viagem para o Pará.

Cheguei em casa e estava muito perturbada com aquele acontecimento. A perturbação demorou alguns bons minutos para passar. E eis que a minha sorte começou a mudar. Como hoje foi um dia produtivo! Cozinhei, li James Joyce, escrevi etnografia de pastor e de crente, comi pêssegos, até consegui ver um filme inteiro, o Machete, descobri o incrível efeito do chá verde com jasmim e mel, fiz carteiras de caixa de leite, desmontei um guarda-chuva e montei outro - o que aliás é uma experiência incrível esta de desmontar guarda-chuvas -, são 21h30 e ainda quero começar a ver um dos dois filmes que finalmente chegaram: mais um Agnes Varda e um filme de Bollywood. Acho que vai ser o Bollywood. E para melhorar mais ainda, o dinheiro que gastei no chapéu já voltou: consegui a minha primeira venda pela Internet, a Jocimara comprou uma de minhas bonitas carteiras feitas a mão por 20 reais. (!!!)

Incrível o que um chapéu engraçado não faz com sua vida. Os chapéis engraçados realmente possuem poderes ainda desconhecidos pela raça humana.

Ps: Não posso deixar de notar que ler o blog do Bill o dia inteiro foi uma atividade, senão a principal, importantíssima para me tirar da Grande Fossa, assim como para me levar a ver um filme inteiro e a escrever esse texto no blog. Obrigada, Bill!!

Um comentário:

bill disse...

Puxa vida Flai, que droga que sua vida anda tão difícil. Mas achei ótimo o tom que vc está usando pra escrever. É muito esperançoso, próprio de quem não pode se dar ao luxo de ficar apenas sofrendo, o sofrimento pode muito bem coexistir com todas as milhares de atividades necessárias.

E, oh meu deus, vc lia meu blog. hahahah, fiquei tão feliz com os elogios!

Confesso que eu ainda tenho idéias pra serem escritas aos montes. Mas estou trabalhando demais, e na real ainda ando muito deprimido. Mas prometo que volto a escrever. Não nesse mês, nem no próximo, mas prometo que volto.

Tudo de bom pra vc, querida!

Beijos