terça-feira, 18 de maio de 2010

Em Defesa da Fraternidade

De acordo com Nietzsche, em sua obra Genealogia da Moral, a exaltação moral da qualidade da fraternidade é a expressão de uma "rebelião moral escravista", realizada por aqueles que estão em situação de desvantagem social; seja em razão de suas capacidades materiais, seja em razão da índole de suas oportunidades fixadas pelo destino. Aqueles que saem em defesa da moral fraterna tem ressentimentos contra o estilo de vida do estrato senhorial que vive livre de obrigações.

Em relação a uma certa comunidade, esta assertiva explicaria o por quê da juventude de seus membros: a situação de certa classe de idade que se encontra temporariamente fora de qualquer oportunidade para exercer suas capacidades materiais e do destino, posto que se encontram abaixo de hierarquias e, em seu processo de reflexão de si e do mundo, muitas vezes se dão conta de que nunca poderão alcançar o estilo de vida senhorial, mesmo porque para tanto, seria necessário escravizar outro montante.

A exaltação moral da fraternidade pode ser encontrada em diversas manifestações da communitas, como os hippies artesãos a percorrerem as estradas, os punks de uma outra época nas esquinas sobrevivendo do lixo.

No que diz respeito a referida comunidade, tal assertiva nietzschiana também explicaria a própria construção e existência de seu líder, um jovem seminarista que passa a se auto-construir em prol de uma moral fraterna que em tudo é contrária ao estilo senhorial do qual o mesmo deveria ser parte: um senhorio que se nega a tanto, vestindo seu corpo com trapos e se negando a chinelos, instaura uma contradição na medida em que o faz sem abandonar uma posição social de senhorio, a saber, a do padre. Assim, constitui-se um homem, um religioso, rebelde à Igreja porém ao mesmo tempo fiel à Igreja.

De acordo com Weber, o profeta encontra seu lugar habitual nas classes menos privilegiadas da sociedade, a partir de uma lógica religiosa onde o indivíduo por si passa a buscar, desejar, sua salvação - que quer dizer livrar-se de seus sofrimentos. Este tipo de religiosidade tornou-se um substituto, ou um complemento racional, para a magia. A isto, Max Weber chamará de racionalização. Para Weber, em sua maior parte este processo de racionalização está desligado da teoria nietzschiana do ressentimento, apesar de se tratar de uma transformação da noção de sofrimento. Neste sentido, o surgimento das religiões de salvação está atrelado com as transformações da noção de sofrimento e também à ascensão de um indivíduo, em contrapartida de uma noção comunitária que lhe antecedia. É como se o ressentimento de Nietzsche fosse uma estrutura quase imutável, que funciona feito um cubo mágico que vai brincando em mudar a ordem das cores, mas a forma se mantém; e o que muda são outras coisas que o rodeiam.

Para Weber, o fato de o profeta encontrar seu lugar habitual nas classes menos provilegiadas da sociedade se dá porque em geral, os oprimidos, ou pelo menos aqueles que se vêem acossados pela miséria, têm necessidade de um redentor, um salvador, que muitas vezes aparecerá na figura de um messias (que nunca chega) ou de um profeta (diversos na história). De repente, penso que pode ser um problema classificar a juventude como uma "classe oprimida", ou "sem poderes". Dizer que a juventude não tem poder é complicado. Ainda mais se tratando de uma juventude classe média. Assim, penso ser melhor dizer que estes jovens se direcionam a um empoderamento que se dá via pertença religiosa. Acredito que esta maneira de se ver a situação também é válida para aqueles que Weber classifica de "oprimidos": seja qual for a forma de opressão, hoje em dia o que se vê são indivíduos se empoderando pela via religiosa, e isso incluirá todo o discurso do sofrimento e salvação, e então se empoderam mediados por um redentor que os salva, conferindo-lhes todo tipo de poder - que pode se manifestar em dons,no caso dos carismáticos, ou em bens materiais, no caso dos protestantes, por exemplo. Um bom exemplo para pensar é uma mulher classe média, mas que não manda em nada na casa ou no dinheiro, devido a uma posição feminina, e vai encontrar uma forma de se empoderar através de uma liderança carismática. Desse ponto de vista, a coisa fica mais prá Joel Robbins.


No caso da comunidade analisada, a grande questão será a das vias de seu empoderamento. Isto porque jogam com um modo de adquirir poder que está para além de uma espera do messias para sanar seus sofrimentos. Buscam se aproximar do sagrado a partir de toda uma gama de renúncias, como a castidade, a renúncia a todos os bens materiais e à família, o jejum, a restrição ao sono e até mesmo o sofrimento, infligido deliberadamente mediante a mortificação, como ficar de joelhos por três horas diárias, dormir no chão. Conforme nos ensinou Max Weber, este conjunto de práticas constituem uma ascese para a aquisição dos valores sagrados mais estimados,chamados, pelo autor, de "carismas".

Max Weber já alertara que a aquisição dos valores sagrados supremos, como os êxtases, os transes, as visões, as experiências místicas contemplativas, as inspirações, etc., nunca foi universal, para as massas. Historicamente, estes estados psíquicos não tem sido as constantes da vida cotidiana. Para Weber, o processo de racionalização configurou como dogma de que os homens estão diversamente qualificados no sentido religioso, o que quer dizer que nem todos podiam ascender ao nirvana,ou a união contemplativa com a divindade, ou a possessão orgiástica ou ascética de Deus.

Nenhum comentário: